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Jornal do Meio Dia

No Dia da Consciência Negra, Jornal do Meio-dia discute impacto histórico da escravidão e racismo estrutural com o Professor Luiz Fernando Valle

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O Jornal do Meio-dia desta quinta-feira, 20 de novembro, abriu a edição especial do feriado com uma entrevista que trouxe contexto, história e reflexão sobre o Dia da Consciência Negra, data que marca a luta contra o racismo e homenageia Zumbi dos Palmares. Para explicar a construção da desigualdade racial no Brasil e os desafios atuais, o programa recebeu o Professor Luiz Fernando Valle, especialista em história e educação.

Logo no início, o professor destacou que o Brasil, em seus mais de 500 anos, passou cerca de 300 anos sob escravidão, deixando marcas profundas que permanecem na forma de desigualdades econômicas, sociais e, principalmente, estruturais. Ele explicou que a escravidão moderna, diferente de formas anteriores, se apoiou na cor da pele e consolidou uma hierarquia racial que moldou as bases do país. “O processo de racialização transformou diferenças em justificativas para desumanizar pessoas”, afirmou.

Valle também abordou como teorias pseudocientíficas do fim do século XIX influenciaram intelectuais brasileiros, que defendiam a ideia de “branqueamento” da população como caminho para o desenvolvimento — pensamento que, segundo ele, ainda reflete na forma como a sociedade seleciona quem pode ocupar espaços de poder. Embora cidades como Itapetininga tenham uma maioria autodeclarada branca, o professor destacou: “Basta olhar capital e regiões metropolitanas: populações majoritariamente negras não se veem representadas nos cargos de decisão”.

Sobre racismo estrutural, conceito amplamente debatido hoje, Valle resumiu de forma direta: trata-se de um mecanismo que organiza instituições, oportunidades e percepções. Ele citou exemplos do cotidiano: profissionais negros identificados automaticamente como seguranças mesmo quando usam terno; papéis de destaque em novelas historicamente negados a artistas negros; e a surpresa de parte da população ao encontrar médicos, professoras e executivos negros.

O entrevistado também comentou o papel das cotas, defendendo que, embora não resolvam a raiz do problema, são um mecanismo necessário enquanto a base educacional brasileira não passa por uma transformação profunda. “Não é o ideal, mas é o possível. Quem não é visto, não é lembrado”, disse.

Ao falar sobre marcos históricos como Zumbi dos Palmares, o professor reforçou que a reflexão sobre igualdade racial deve ser diária, mesmo que a data sirva como ponto de memória. Ele também citou episódios recentes de intolerância religiosa nas escolas, enfatizando que o ambiente escolar deve ser entendido como espaço de cultura e conhecimento — não de rituais — e que crianças precisam aprender a conviver com a diversidade.

Para encerrar, Valle foi questionado sobre como cada pessoa pode agir no combate ao racismo estrutural. Ele frisou que o primeiro passo é conhecer, ouvir e compreender a dor do outro. Lembrou ainda a frase frequentemente citada por Mano Brown: “Essa é pra você que não virou comida de tubarão”, destacando que muitos nem chegaram à margem por conta da violência histórica da escravidão.

“São mais de 300 anos de desumanização e apenas 150 buscando reconhecimento. Ainda há muito a ser alcançado. Não é mimimi. É história. É realidade”, concluiu.